Departure...
Listenning to: Rurouni Kenshin - Departure (piano solo)
Ainda não era bem noite, mas a escuridão já estendia os seus longos braços pelas casas adentro. Não havia um único movimento, um único som. Toda a cidade parecia morta. Numa das casas, deitada na cama, uma rapariga jazia imóvel, de olhos abertos. À primeira vista sem vida, quem olhasse melhor veria o seu peito arquejar de forma suave, quase imperceptivelmente. O olhar vazio, negro como a escuridão que a rodeia. Espalhadas à sua volta, estão cartas, frases, palavras, momentos perdidos que formam um todo nela. Uma mão segura um papel amarrotado pelo tempo, papel esse com marcas de lágrimas ainda recentes. Aos poucos, os olhos fecham-se e toda ela se encolhe, como se querendo esconder do mundo. Como uma criança que necessita de protecção. Lá no fundo, uma música de piano começa a fazer-se ouvir. A harmonia das teclas, aquele som cristalino, que lhe traz tantas recordações e mágoa. Mantendo os olhos fechados, os seus lábios abrem-se num sussurro... Ele... Está a chamá-lo... Volta... Mas ele não a ouve... Nunca ninguém a ouve... Apoiando-se numa mão, obriga o corpo a levantar-se da cama, caminhando em passos hesitantes até à janela. Afasta a cortina para o lado e olha o céu. Escuro... Sem estrelas, nem lua. Nenhuma presença. Pergunta-se se onde ele está, o céu é igual e deseja profundamente que ele tenha pelo menos uma estrela para o guiar e proteger. Onde estás...? Os seus lábios contraem-se, numa tentativa de não chorar. Dos olhos negros, uma lágrima escorre em direcção ao pescoço e ela baixa a cabeça, envergonhada. Fecha o punho, amarrotando ainda mais o papel na mão, de forma a controlar as emoções. O piano continua a soar e, de repente, um sussurro faz-se ouvir atrás dela. Estou aqui... Endireita-se rapidamente, reconhecendo a voz. Os seus olhos brilham, não só pelas lágrimas, mas pela surpresa. Vira-se lentamente, insegura e receosa. Ele está ali... O papel que tinha estado preso na sua mão desliza para o chão e ela estende o braço na direcção dele, tentando alcançá-lo, tocar-lhe. Ele dá um passo atrás e baixa a cabeça, afastando o olhar, numa expressão triste, derrotada. Por favor... A rapariga avança mais um passo, com o braço esticado, mas ele recua outra vez. Desculpa... Não me faças isto... Mas ele parece não a ouvir. Permanece imóvel, o mesmo ar cansado, amargurado e frágil. Por favor... Desculpa... Não me deixes... Num acto de desespero, corre para abraçá-lo, mas ele desaparece assim que ela lhe toca. Com os olhos abertos de pavor, a rapariga deixa-se cair no chão, incrédula e com as feridas a reabrirem-se mais uma vez. Aninhando-se como um bebé, os soluços fazem o seu corpo estremecer violentamente. O piano acompanha-a sempre... Porquê...? Porquê...?
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